LEMBRANDO ALFREDA
RONALD MENDONÇA
MEMBRO DA AAL
Alfreda ou Fredão, para os íntimos, foi uma
das mais queridas amigas de infância. Literalmente, crescemos juntos. Ela era
filha única, órfã de pai (um engenheiro especialista em ferrovias), sua mãe
nunca se concedeu olhar para outro homem.
O engenheiro deixara uma boa pensão
e bens suficientes para uma vida sem atropelos. Parece que estou a ver dona
Melinha. Esquálida, suspirosa, olhos azuis encovados, encravados numa
fisionomia com precoces sulcos, num
rosto razoavelmente bonito.
Alfreda, nossa parceira de memoráveis
rachas no Sete Lobão (uma clareira em forma de bacia encravada na “Mata do
Leão”), tinha o tronco forte, seios pequenos, braços musculosos e temidos por
todos. A natureza deteve-se justo no momento em que a tornaria bonita. Era o(a)
nosso(a) principal artilheira (o). Chutava com os dois pés indiferentemente.
Juro que não estou sendo leviano, mas Alfreda jogaria em qualquer clube de
Alagoas. Era titular absoluta do Bebedourense e do Juventus.
A convivência de Alfreda com os
garotos causava uma certo espanto no pacato Bebedouro. Lembro de alguns
arranca-rabos. Com efeito, companheiros um pouco mais velhos ensaiaram carícias mais ousadas e não autorizadas,
abaixo da linha de cintura de Fredão. O resultado foi quase catastrófico. Nossa
amiga andava com um canivete japonês, cujo habilidoso manejo botava pra correr
o mais destemido dos Casanova.
Nem só de futebol vivia a
rapaziada bebedourense. Aos sábados curtíamos o 20 de julho, clube social
frequentado pela ala leste do bairro. Apesar dessa convivência com os rapazes,
Alfreda também tinha prestígio entre as garotas. Sabia inglês, um diferencial naqueles tempos de monoglossia e
de poucas escolas particulares. Por isso, era chamada a dar aulas às meninas.
Tinha fama de boa professora.
Há muitos anos, o 20 de julho era
dirigido pelo “seu” Melé. Não era um mau
presidente, contudo, depois de quase um decênio, urgia providenciar um
substituto. Melé era tão poderoso e tão respeitado que elegeria quem ele
quisesse. Ninguém parecia bom suficiente para substituir o lendário Melé. Botou
um anúncio no jornal e convocou uma reunião para definir a sucessão. A essa
altura nossa Alfreda pisara em outros solos, mas nunca esqueceu as origens. Sua
elegante presença de terninho e gravata impressionou a todos. Melé não resistiu
quando ela sacou da bolsa uma minimáquina de datilografia. Não havia mais
dúvidas, Fredão era a grande gerente que comandaria o 20 de julho. Em um ano de
gestão, nossa amiga conseguiu “quebrar” o único lazer que o bebedourense tinha.
Era uma incompetente de carteirinha.
Nenhum comentário:
Postar um comentário