Leandro Narloch
Alguns amigos ficaram espantados com a entrevista do cantor Chico Buarque ao El País, na segunda-feira da semana passada. Justamente quando líderes históricos abandonam o PT e o Congresso Estadual do partido em São Paulo sofre falta de participantes, Chico Buarque não só segue apoiando o PT como considera a crise do partido pura intriga da oposição. “Querem enfraquecer o governo para que, em 2018, o PT chegue desgastado nas eleições”, disse ele.
Houve quem chamasse o cantor de louco ou desinformado, mas na verdade a posição de Chico Buarque é racional e coerente com incentivos econômicos. Do ponto de vista da economia da política, é vantajoso teimar numa opinião errada.
Explico a ideia comparando duas situações:
SITUAÇÃO A – Chico Buarque precisa comprar um apartamento em Paris. A decisão cabe 100% a ele. Se escolher mal, Chico Buarque será o maior afetado pelo equívoco.
SITUAÇÃO B – Chico Buarque precisa decidir em quem votar. A decisão cabe não só a ele, mas a outros 142 milhões de eleitores. Dificilmente a eleição dará empate, por isso o voto dele não fará diferença alguma. É incerta a influência que o apoio de Chico Buarque ao candidato A ou B terá sobre outros eleitores. Na remota hipótese da influência de Chico Buarque decidir uma eleição, ele será pouco afetado por uma eventual decisão errada. O prejuízo causado pela decisão será dividido por 200 milhões de brasileiros. Chico Buarque será um dos menos afetados – afinal sempre pode dar um tempo do Brasil em seu apartamento em Paris.
A teoria da ignorância racional, formulada em 1957 pelo economista Anthony Downs, explica por que eleitores gastam tão pouco tempo para escolher o melhor candidato. Os eleitores intuitivamente sabem que cada voto tem um peso muito pequeno e dificilmente decidirá uma eleição. Ora, se tempo é dinheiro, e gastar tempo escolhendo um político terá pouco efeito nas urnas, então é racional ser um eleitor ignorante. A Situação A traz bem mais incentivos para uma boa decisão que a Situação B.
Em 2001, o economista Bryan Caplan refinou o raciocínio de Downs apresentando a teoria da irracionalidade racional. Se Downs acreditava que é racional pensar pouco, Caplan foi mais longe: é racional pensar bobagem e insistir em equívocos sobre a política. Se os eleitores se satisfazem mantendo algumas crenças, e se o custo de manter essas crenças é baixo, ser irracional se torna racional. “Em eleições com milhões de eleitores, a probabilidade de uma crença individual errada causar políticas ruins é quase nula”, diz Caplan. “Por isso é previsível que os eleitores adotem seu pior comportamento cognitivo” e exibam “ausência de espírito crítico, irritabilidade, credulidade a simplicidade”.
Em geral, quanto menor o custo de uma crença ao indivíduo, maior a demanda para ela:
O gráfico que explica Chico Buarque: se o custo da irracionalidade cai, a demanda por ela aumenta
A teoria de Caplan explica por que tanta gente teima em partidos e ideologias obsoletas mesmo quando eles se revelam pura fraude. Se o eleitor é uma figura pública, então é ainda maior o custo de mudar de ideia. Seria preciso admitir a todos a estupidez pregressa.
Por isso eu peço aos meus amigos que parem de dizer que Chico Buarque é louco, insensato ou sonhático. O homem obedece a incentivos econômicos. Está em total controle de suas faculdades mentais.
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