GOSTO
DE BALA
Almeidinha costumava usar terno branco, vestia-se elegante,
sapato duas cores, bigodinho delineado, lábios grossos, indícios da descendência
africana. Caixeiro viajante, trabalhava no meio do mundo. Vendia todo tipo de
relógio, pulso, parede, despertador, ponto. Embolsava boas comissões das
fabricas de São Paulo, excelente vendedor, conversador, simpático, convencia os
clientes, lábia fina para negócios e para as mulheres. Em seu cartão de visita estava escrito José
Maria Peixoto de Almeida – Representante Comercial; eram três cartões
diferentes, um para cada local onde morava. Almeidinha, antes de tudo, era um
forte, sustentava três mulheres, três casas, trígamo assumido. Montou família
em Maceió, em Monteiro na Paraíba e em Picos no Piauí. Organizado, morava uma
semana em cada residência. Darlene, a piauiense lhe deu dois filhos, Juçara, a
paraibana, pariu três vezes. A alagoana Malena não conseguiu engravidar. Ao
retornar à Maceió, Almeida entrava em maratona sexual na ânsia de engravidar a
esposa alagoana. Consultaram médicos, fizeram exames. Nenhuma anormalidade, o
casal em excelente saúde física.
Certo final de
ano, Almeidinha deixou até a boemia, frequentador assíduo da Zona de Jaraguá, encrenqueiro,
quando bebia fazia arruaça, chegou a ser preso envolvido em briga por rapariga.
Entretanto, naquele dezembro Zé Maria comportou-se, questão de honra engravidar
a bela e gostosa Malena, a mais jovem das três, 19 anos. Passou uma semana e meia
de amor nos braços, abraços, carinho e amor da esposa, quase não saiu de casa, visitou
poucos clientes. Malena, depois do amor, ficava deitada, pernas levantadas, pés
nas paredes, instrução do médico para engravidar. Logo depois do Natal, Almeida
partiu, ano novo com Juçara, a paraibana. Meado de janeiro apareceu a
menstruação de Malena, uma tristeza, ficou deprimida, raiva do marido. Maldizia
o sangue que acabava, mais uma vez, o sonho de ser mãe.
Ao cair da tarde, a bela triste, tinha apenas
uma diversão, debruçar-se sobre a janela apreciando o movimento das ruas de
Bebedouro. Os homens gostavam, fantasiavam peripécias nos fartos seios de
Malena, beleza estonteante, atraente. As mulheres enciumadas, despeitadas, chamavam-na
de sem-vergonha, quenga, entretanto, jamais alguém viu caso de traição.
Certa tarde
o coração de Malena bateu mais forte ao reconhecer um ex-namorado da
adolescência fardado da Academia Militar das Agulhas Negras. O Cadete Villanova
ao avistar sua ex-namorada cumprimentou-a com vasto sorriso, parou, dois dedos
de prosa na janela, continuou o caminho até sua casa à beira da Lagoa Mundaú em
Bebedouro. Toda tarde o jovem cadete Arísio Villanova saía em busca dos amigos
e diversões de férias, passava invariavelmente pela janela de Malena. Certa vez,
em conversa rápida, a serelepe informou, o marido estava viajando para as
bandas de São Paulo, convidou Villa para discreta visita noturna.
Combinaram entrar
pelos fundos da casa às 19 horas, ela deixaria a porta aberta, conversariam no
quintal. Entusiasmado com a aventura, Villanova, bom cadete de Infantaria, fez
progressão noturna sobre o campo, transpôs a linha férrea até chegar ao portão
azul, estava escuro, sabia a cor por ter feito o reconhecimento do terreno,
como bom militar. Não precisou bater, Malena, pontual, abriu o portão. Os dois
se atracaram, muitos beijos, muitos desejos presos desde que eram inocentes
namorados. Deitados no quintal fizeram amor noite à dentro. O cadete Villa, testosterona
alta, saiu da casa de madrugada, cinco vezes amor, lindo e poderoso que nem a
juventude. Arísio Villanova passou algumas noitadas frequentando o quintal da
casa de Bebedouro.
Certa noite, uma
vizinha percebeu um vulto entrando no quintal da Dona Malena, ficou na
espreita, reconheceu. A vitalina, além de espalhar a notícia, foi ao pai do
cadete, alertando o perigo que o filho corria, o marido era valentão,
arruaceiro; sabendo do chifre, não ia deixar por menos. Dr. Afrânio Villanova
chamou o filho particular. No quarto, o pai tirou do bolso uma nota de Cr$ 100,00
(cem cruzeiros), lhe entregou, foi
contundente no argumento: “Meu filho, Maceió tem 100 mil habitantes, desses, 50
mil são mulheres; dessas pelo menos 500 estão disponíveis para você esta noite.
Vá à rua, procure uma delas, menos Dona Malena, meu filho... beijo de mulher
casada tem gosto de bala!!!
Desde essa dia o
cadete Villanova não mais retornou ao quintal de Malena, percebeu o perigo da
aventura. Dois anos depois, Almeidinha largou a jovem esposa, arranjou outra
alagoana, fez mais três filhos. Malena terminou rapariga na Zona de
Jaraguá. Villanova, hoje Coronel
reformado do Exército Brasileiro, recorda, nunca esqueceu as aventuras daquelas
férias de verão, os beijos de Malena com gosto de bala.
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