Hiroshima, logo após a bomba - 1945 - 2015 ( 70 anos)
ESPECULAÇÕES
Sempre se especulou sobre por que o físico alemão Werner Heisenberg foi conversar com o físico dinamarquês Niels Bohr em Copenhagen, em setembro de 1941. Heisenberg dirigia o programa nuclear da Alemanha e teria ido informar Bohr sobre o progresso da sua pesquisa, pedir sua ajuda, sondar o amigo sobre o que este sabia das pesquisas realizadas nos Estados Unidos depois da chegada de Enrico Fermi, ou – a especulação mais intrigante – levado a Bohr a proposta de um compromisso, a ser assumido por cientistas dos dois lados, de não construir a bomba ou de sabotar a sua construção?
A simples especulação de que esta proposta teria sido feita trazia algumas implicações curiosas. Uma, a de que o próprio Heisenberg estaria deliberadamente atrasando o programa nuclear dos nazistas. Outra a de que, mesmo se soubessem como fazê-la, os cientistas alemães não teriam construído a bomba. Outra, a de que o apelo de Heisenberg seria a valores humanísticos acima de lealdades passageiras a pátrias e regimes, ou a uma sensibilidade comum europeia, com a esperança que ela tivesse sobrevivido na América.
Parte da oportunidade que a América dava à ciência para levar a pesquisa nuclear à sua conclusão lógica e prática era livrá-la de escrúpulos e culpa, ou seja, livrá-la da hesitação europeia. Heisenberg estaria propondo uma conspiração da consciência, contra o pragmatismo americano e contra a volúpia histórica da ciência de perseguir toda descoberta até o seu fim, mesmo que o fim fosse o terror, no caso o terror nuclear.
Documentos recém-publicados mostram que Heisenberg não propôs nada parecido a Bohr, que Bohr só guardou da visita sua preocupação com a possibilidade de os nazistas terem a bomba primeiro e a certeza consoladora de que Heisenberg e seu grupo não estavam nem perto de conseguir isso. Na verdade, o que atrasou o programa nuclear alemão não foi a consciência mas o preconceito burro: os nazistas achavam que física teórica era “coisa de judeu” e custaram a entender todas as implicações do átomo partido. Da mesma forma, foram as novas leis raciais italianas, inspiradas pelas nazistas, que forçaram a ida de Enrico Fermi, cuja mulher era judia, para os Estados Unidos e a emigração da maioria da sua equipe.
A ideia de que Heisenberg representava uma resistência do espírito europeu ao horror da bomba em contraste com o pragmatismo americano, mesmo falsa, permanece uma metáfora forte. Heisenberg teria sido o gênio nuclear que não cruzou o Atlântico, o antiexilado, o que não aproveitou a oportunidade oferecida pela América, da ciência sem remorsos, e fracassou.
Sem o vício do antissemitismo os alemães teriam feito a bomba antes? Como todas as outras especulações, esta continuará para sempre uma especulação. De qualquer jeito, quem ficou com a bomba não foi o Hitler, foi o Truman.
Em 2015, a explosão de bombas atômicas sobre Hiroshima e Nagasaki fará 70 anos.
Sempre se especulou sobre por que o físico alemão Werner Heisenberg foi conversar com o físico dinamarquês Niels Bohr em Copenhagen, em setembro de 1941. Heisenberg dirigia o programa nuclear da Alemanha e teria ido informar Bohr sobre o progresso da sua pesquisa, pedir sua ajuda, sondar o amigo sobre o que este sabia das pesquisas realizadas nos Estados Unidos depois da chegada de Enrico Fermi, ou – a especulação mais intrigante – levado a Bohr a proposta de um compromisso, a ser assumido por cientistas dos dois lados, de não construir a bomba ou de sabotar a sua construção?
A simples especulação de que esta proposta teria sido feita trazia algumas implicações curiosas. Uma, a de que o próprio Heisenberg estaria deliberadamente atrasando o programa nuclear dos nazistas. Outra a de que, mesmo se soubessem como fazê-la, os cientistas alemães não teriam construído a bomba. Outra, a de que o apelo de Heisenberg seria a valores humanísticos acima de lealdades passageiras a pátrias e regimes, ou a uma sensibilidade comum europeia, com a esperança que ela tivesse sobrevivido na América.
Parte da oportunidade que a América dava à ciência para levar a pesquisa nuclear à sua conclusão lógica e prática era livrá-la de escrúpulos e culpa, ou seja, livrá-la da hesitação europeia. Heisenberg estaria propondo uma conspiração da consciência, contra o pragmatismo americano e contra a volúpia histórica da ciência de perseguir toda descoberta até o seu fim, mesmo que o fim fosse o terror, no caso o terror nuclear.
Documentos recém-publicados mostram que Heisenberg não propôs nada parecido a Bohr, que Bohr só guardou da visita sua preocupação com a possibilidade de os nazistas terem a bomba primeiro e a certeza consoladora de que Heisenberg e seu grupo não estavam nem perto de conseguir isso. Na verdade, o que atrasou o programa nuclear alemão não foi a consciência mas o preconceito burro: os nazistas achavam que física teórica era “coisa de judeu” e custaram a entender todas as implicações do átomo partido. Da mesma forma, foram as novas leis raciais italianas, inspiradas pelas nazistas, que forçaram a ida de Enrico Fermi, cuja mulher era judia, para os Estados Unidos e a emigração da maioria da sua equipe.
A ideia de que Heisenberg representava uma resistência do espírito europeu ao horror da bomba em contraste com o pragmatismo americano, mesmo falsa, permanece uma metáfora forte. Heisenberg teria sido o gênio nuclear que não cruzou o Atlântico, o antiexilado, o que não aproveitou a oportunidade oferecida pela América, da ciência sem remorsos, e fracassou.
Sem o vício do antissemitismo os alemães teriam feito a bomba antes? Como todas as outras especulações, esta continuará para sempre uma especulação. De qualquer jeito, quem ficou com a bomba não foi o Hitler, foi o Truman.
Em 2015, a explosão de bombas atômicas sobre Hiroshima e Nagasaki fará 70 anos.
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