domingo, 2 de junho de 2013

UM TEXTO DE ÉLIO GASPARI

"De João.Figueiredo@edu para Dilma@gov". Por Elio Gaspari

Na foto: João Baptista Figueiredo.

Excelência,

Nossa convivência foi nula. Eu estava no Palácio, e a senhora estava na cadeia. Mesmo assim, sei mais de sua vida hoje do que sabia quando chefiava o SNI. Há uns meses, o Geisel, que mal fala comigo, contou-me que a senhora tornou-se navegadora do avião presidencial para desviá-lo de turbulências.

Ele estava horrorizado porque a mulher dele, Lucy, tinha horror a avião e, mesmo sendo ditadores (para usar sua expressão), nunca fizemos isso.

Agora, a repórter Natuza Nery contou sua história. No meu tempo, fui atrás do vagabundo que gozou o episódio em que, ao botar umas flores no túmulo do Soldado Desconhecido, em Paris, queimei-as na chama votiva. Brigar com jornalistas foi desperdício de coronárias. Eu fiz besteira, mas não vi a labareda.

Escrevo-lhe para pedir que alongue os pavios do Palácio. O seu, como o meu, é curto e vocabularmente agressivo. Resulta disso que encurtou também o da chefe da Casa Civil, a Gleisi Hoffmann, com seu ar angelical. Quando agressiva, ela fica patética.

Eu fazia um gênero cafajeste, afinal, vinha da cavalaria. A senhora faz o tipo durona, pois veio da VPR. Nem todo mundo precisa ser como nós, mas Palácio é assim mesmo, muda os outros à nossa imagem e semelhança. Eles fingem achar que somos divindades.

Quer saber? Explodir não adianta nada. Os nossos assessores riem. Alguns deles concluíram que eu tinha ficado maluco. Acabei enfartando. Quando vejo a serenidade do Tancredo, o bom humor do JK, o fatalismo do Getulio, concluo que eu e o Jânio tínhamos muito a aprender.

O Lula finge que explode, mas tem uma veia de vulgaridade parecida com a minha. Leva vantagem porque a administra melhor e faz-se entender pelo povo, coisa que eu e a senhora não conseguimos.

Outro dia, ouvi a senhora dar um passa-fora no ministro Patriota. Acredite: dou-lhe toda razão, porque ele estava falando bobagem. Eu faria o mesmo, mas hoje sei que não deveria tê-lo feito.

O que adianta brigar com o PMDB? Eu espinafrava aquela gente do meu partido, eles se humilhavam, jurando que não voltariam a trair. Quando chegou a hora, votaram no Tancredo e empossaram o Sarney. Eu não lhe passei a faixa e saí do Palácio pela porta lateral. Fui para casa de alma lavada, mas hoje sei que fiz uma tolice.

Se, em seis anos, não aprendi a ser presidente, a senhora fique certa de que não sou eu quem sabe o que deve fazer. Sei que não deve ficar parecida comigo.

Respeitosamente,

João Baptista Figueiredo.

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