CONFRARIA DOS BARRIGAS BRANCAS
Todo domingo, por volta das 10 horas, eles
se achegam sentando-se à mesa reservada na Barraca Pedra Virada, orla da Ponta
Verde, exuberante cenário, mar e céu azul encontrando-se no infinito. O
rolamento da avenida fechado para carros dá lugar às bicicletas e brincadeira
de meninos, pais, mães e avós correndo atrás. No mesmo momento a Banda de
Música da Polícia Militar, às vezes a do Exército, se acomoda nas cadeiras
embaixo do toldo, afinando instrumentos até iniciar o concerto, duas horas e
meia de boa música, é o excelente programa “Vem Ver a Banda Tocar”. Casais se
abraçam no dancing, se arrastam ao som de belas músicas. Não apenas sucessos do
passado, até Lady Gaga tem vez no repertório.
Enquanto isso os coroas da
Confraria dos Barrigas Brancas vão completando a mesa, iniciando os trabalhos
com cervejinha gelada. O Primeiro a chegar geralmente é o presidente, Doutor
Abynadá Lyro, caruaruense, ao se formar veio a Maceió passar uns dias, ficou
até hoje com sua competência de neurocirurgião e professor da Faculdade. A
maioria dos médicos caminhantes no calçadão vem respeitosamente cumprimentar o
professor. Certa vez apareceu um senhor de bengala, quase cego, chamando-o de
professor, ficou a dúvida quem era mais velho, o professor ou o aluno.
As conversas correm da
política ao cinema, à literatura. Os governos: federal, estadual e municipal,
não têm maioria de aprovação nos debates acirrados entre os confrades. Téo
Vilela, o governador, passando em caminhada cumprimenta ao longe a confraria, e
segue destino.
Radjalma Cavalcante não
perde uma domingueira trazendo sua sabedoria, seus filhos inteligentes dão um
toque jovial aos debates. A conversa tem o privilégio do fundo musical da banda,
o artista eclético, tenor, Dhyda Lyra, acompanha a orquestra cantarolando. Dr.
Everaldo, Barão da Massagueira, escritor e jogador de futebol é assíduo da
roda. Fernando Andrade vem de Penedo para tomar uma seleta no seleto grupo. O
nosso comunista Geraldo Majella, muito bem informado, trás suas opiniões
abalizadas. A confraria é aberta à esquerda, à direita, só não é aceito nêgo
burro ou chato. Quico e Manoel Ramalho,
o Cardeal Manuel Bernardo, Borges, Edson, Roberto Jackson são figuras
constantes na reunião domingueira.
Invariavelmente chega a visita rápida de
Marisol Juana, ex-rumbeira do Circo Garcia nos anos 50/60, não perde o programa
Vem Ver a Banda Tocar, dança, se remexe como se ainda fosse a grande estrela do
circo. No seu delírio de mulher idosa, ao findar a música, abaixa o corpo num
cumprimento como se o povo estivesse aplaudindo, ela ouve palmas apoteóticas embaixo
da lona do circo. Vai à mesa da Confraria receber uma pequena ajuda de
sobrevivência, de mendicância. Ainda é uma excelente dançarina, a música
requebra todo seu corpo, só ela ouve os aplausos, agradece, se sente feliz.
Que nossas esposas não saibam,
periga cortarem nossa diversão concedida generosamente por elas, entretanto,
não podemos deixar de olhar as moças do corpo dourado pelo sol, em pequenos
biquínis, são as coisas mais lindas que vemos passar na passarela do calçadão.
Não dá para não ver. É o prazer dos sessentões conversando sobre mil assuntos e
outras alegrias. É proibido tristeza e reclamação, pode meter o pau em quem
quiser, sem lamento, sem queixa.
São apenas duas horas e
meia, fugazes. Com ajuda da cerveja, uísque, um bom tira-gosto, unem-se amigos,
é a grande necessidade do homem em ser gregário.
Ao meio dia e meio o
presidente Abynadá é o primeiro a ser chamado ao celular, levanta-se faz as
contas da despesa enquanto outros telefones tocam, são as esposas chamando, é
hora de ir para casa, acabou-se a alegria, o bate-papo dominical. Até a próxima
semana para desfrutar a concessão benevolente de nossas companheiras.
Quase esquecia um
esclarecimento importante, Barriga Branca no Ceará é homem mandado, manobrado
pela mulher.
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