sábado, 29 de outubro de 2011

HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA - CARLITO LIMA


A BOMBA.



        Neste ano de glória de 2011, nós, amigos, colegas concluintes do curso da Academia Militar das Agulhas Negras - 1961, faremos um belo encontro comemorando com saudades e lembranças esse cinquentenário.  Entre os colegas certamente encontrarei os coronéis, Rocha e Wanderley
    No final dos anos 60, ambos eram capitães, Rocha servia na Fábrica de Material Bélico em Piquete e Wanderley no 5º Regimento de Infantaria em Lorena, cidades vizinhas, bem próximas. Época de repressão e terrorismo em alta escala, em São Paulo aconteceram vários ataques terroristas a quartéis do Exército e o caso do Capitão Lamarca, contemporâneo da AMAN.
    Rocha depois de uma viagem de férias ao Ceará, como sempre, trouxe um presente para o amigo.  Era uma tarde de quarta-feira não havia expediente no 5º RI. Capitão Rocha parou o carro em frente ao quartel, chamou o soldado sentinela entregando um pacote envolto em papel jornal, pediu para entregar ao Capitão Wanderley. Nesse momento o Tenente, oficial de dia, observava o movimento, percebeu quando um cidadão entregou um embrulho à sentinela, deu partida e acelerou o carro.
    Imediatamente o tenente correu, ordenando ao soldado colocar o embrulho no chão com cuidado, devia ser uma bomba, mandou tocar alarme geral, desesperado gritava, é uma bomba!
    Os soldados bem treinados tomaram posições estratégicas sob o comando de sargentos e cabos, entrincheirados, atrás dos muros e paredes, vigiavam, ao longe, a “bomba”, o embrulho imóvel, soberbo e inatingível no calçamento.
    Todo quarteirão foi interditado, desviaram o trânsito para outras ruas, impedindo qualquer pessoa se aproximar. Enquanto isso o embrulho, no meio da rua, solitário, fazia temer toda população que espreitava nas varandas dos prédios da vizinhança esperando a bomba explodir a qualquer momento. Logo a mídia tomou conhecimento, ficaram na expectativa.  As televisões, jornalistas, fotógrafos se penduravam em prédios fotografando aguardando o anunciado sargento sapador especialista em desarmar bombas.
    Foi nesse clima que o Capitão Wanderley, vindo calmamente de uma pescaria, sentiu o movimento estranho ao passar perto do quartel.
    Os soldados relataram o ocorrido, o Capitão, autoridade, foi verificar mais próximo o pacote, ao olhar a “bomba” de perto se emocionou, reconheceu os abençoados pacotes, presentes constantes do amigo Capitão Rocha.
    Procurou imediatamente o Oficial de Dia, contou sua versão sobre o pacote. O Tenente, nessa altura, não admitia outra hipótese, a não ser bomba.
    Os soldados protegidos, abrigados, ficaram apavorados quando o Capitão acercou-se da bomba, sem proteção, indefeso.
    Wanderley, com água na boca, pensava no presente, aproximou-se do embrulho. A expectativa e o silêncio tomaram conta da multidão, dentro e fora do quartel acompanhavam a insensatez, a maluquice do Capitão.
    Com o embrulho aos pés, num gesto contínuo, Wanderley abaixou-se, acocorou-se, segurou o pacote, imediatamente foi abrindo pelos lados, retirou o papel jornal, as palhas de bananeiras protetoras, até aparecerem 12 bonitas barras de rapaduras, douradas, como se fossem barras de ouro nordestino.
    Com os dedos, indicador e mindinho, quebrou um pedaço da rapadura, levou-o à boca, deu uma bela dentada, sorriu de satisfação. Colocou o pacote nas axilas, retornou andando devagar e calmo como ele próprio. Mastigava carinhosamente a rapadura, lambendo os beiços diante de uma enorme plateia pasmada, incrédula no que via acontecer, todos boquiabertos esperando a bomba explodir, soltaram um uníssono e exclamativo. “Oh”. Foi um alívio geral, a paranóia naquela época era contagiante.

OBS - ESTA CRÔNICA É PUBLICADA NA GAZETA DE ALAGOAS, NA TRIBUNA DO SERTÃO NA TRIBUNA DO CARIRI, NO JORNAL DA BESTA FUBANA, NO BLOG DO CHICO BRUNO, NO SITE PNET DE LISBOA E MAIS 9 BLOGS NO PAÍS.

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