Rien de rien
Ronald Mendonça
Médico
Instante é um dos poemas mais conhecidos de
Jorge Luís Borges, o falecido escritor
argentino. É uma reflexão poética sobre o passado de um cidadão que lutara a
vida toda contra a assustadora perspectiva de conviver nas trevas da cegueira, tragédia
pessoal que marcou sua existência. Aos
85 anos, algo arrependido, Borges observa
que poderia ter tomado mais sorvetes, que não devia ter levado a vida tão a
sério e lamenta não ter sido mais tolo
do que foi. Se lhe fosse permitido
retornar, trataria de cometer mais erros, de ser menos certinho e mais feliz... Naquele
instante, reconhecia, era um pouco tarde para pôr em prática as coisas que deixara de fazer.
João Cabral de Melo Neto, também teve seu ato de contrição ao pressentir o “bafo da magra” rondando seu
leito. Com efeito, o autor de Morte e
Vida, faria comovente desabafo lamentando o distanciamento de sua primitiva
religião, das suas ave-marias, orações ensinadas pela mãe e que, por insegurança,
modismo ou mero desafio, as renegara. Conta-se que, nos estertores, teria
pedido para ouvir uma salve-rainha. Antes
de partir, queria ficar de bem com a mãe do Céu.
Diferentemente de Sinatra, que em My Way proclama uns poucos arrependimentos, ao interpretar Je ne regrette rien, a outonal Edith Piaff, apesar de todas as
agruras pessoais, concupiscências e revertérios, ao lado de uma vida de fama e
sucesso, solta a potente voz de contralto
e em altos brados desautoriza qualquer arrependimento.
Gozando
as delícias de doce refúgio em um balneário paulista, quem também se recusa a
qualquer penitência é o terrorista
italiano Cesare Battisti, hoje mais um honrado cidadão brasileiro. Capa da
IstoÉ dessa semana, é o tal cara que na Itália integrava uma facção criminosa.
Trânsfuga internacional, no seu país está condenado à prisão perpétua por assassinatos.
Segundo boa parte dos italianos, não
passa de um bandido comum.
Todos sabem que os grandes psicopatas não têm
arrependimentos. Fascinados pela autoria
de crimes com requintes perversos, muitas vezes, em juízo, são compelidos a sinalizar essa “fraqueza”, apenas para se livrarem de condenações menos suaves.
Remorsos
uma ova! Battisti dispensa-se dessa farsa pequeno-burguesa. Por cima da carne seca, ídolo gauchiste, tem em Lula e Tarso Genro
fiéis escudeiros. Aliás, Genro, ao hostilizar o governo italiano denominando-o
de decadente, tem intencional dismnésia que o impede de lembrar que ordenha em
um governo em insustentável declínio moral.
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