quarta-feira, 1 de maio de 2013

JB NA HISTÓRIA


30 de abril de 1988: Agora, falando sério... Jô Soares e a lista Negra da Rede Globo

No dia 30 de abril de 1988, quando deixava a Rede Globo para estrear um programa de entrevistas no SBT, o humorista Jô Soares publicou no Jornal do Brasil o artigo: Agora, falando sério.
Artigo: Agora, falando sério, por Jô Soares. Jornal do Brasil, 30 de abril de 1988

"Em 1947, os grandes produtores de Hollywood se reuniram no hotel Waldorf-Astoria, em Nova Iorque, e resolveram que artistas com tendências políticas em desacordo com seu ideário não trabalhariam mais em filmes. Surgia a "LISTA NEGRA" e a conseqüente caça às bruxas. Em pouco tempo, não somente radicais ou liberais eram perseguidos. Qualquer artista que desagradasse aos chefes de estúdio era listado e não conseguia mais trabalho.

Com um impecável senso de oportunidade, a TV Globo escolheu exatamente o momento da Constituinte no Brasil para inaugurar sua "LISTA NEGRA". Quem sair da emissora, sem ter sido mandado embora, corre o risco de não poder mais trabalhar em comerciais, sob a ameaça de que estes não serão lá veiculados. Como a rede detém quase que o monopólio do mercado, os anunciantes não ousam nem pensar em artistas que possam desagradá-la.

Neste ponto, alguém pode achar que eu estou falando por interesse pessoal. Garanto que não. Não falo pelo fato de os meus comerciais não poderem ser exibidos, nem pelo fato mais recente, das chamadas pagas do meu novo espetáculo no Scala 2 “O Gordo ao vivo!” terem sido proibidas. Sou um artista muito bem remunerado e meus espetáculos têm outros meios de divulgação. Graças a Deus, meus shows de humor já lotavam teatros antes que eu fosse para a Globo. Que as chamadas de “O Gordo ao vivo!” não passariam na emissora, eu já sabia desde outubro, pelo próprio Boni, que me disse, em sua sala, quando fui me despedir: – Já mandei tirar todos os seus comerciais do ar. Chamadas do seu novo show no Scala 2, também esquece, e estou vendo como te proibir de usar a palavra ‘gordo’. Claro que esta última ameaça ficou meio difícil de cumprir. A megalomania ainda não é lei fora da Globo.

Logo, não é por isso que escrevo, pela primeira vez, sobre este assunto. Saí da Globo, onde conservo grandes amigos, com a maior lisura, e nunca me aproveitei deste espaço em causa própria. Escrevo, isto sim, porque atores que trabalham no meu programa, como Eliezer Motta, como Nina de Pádua, foram vetados em comerciais. As agências foram informadas, não oficialmente, é claro, como acontece em todas as "LISTAS NEGRAS", que suas participações não seriam aceitas.

É triste, nesse momento, em que se escreve diariamente a Democracia no Congresso, uma empresa que é concessão do Estado cerceie impunemente o artista brasileiro, de um modo geral já tão mal remunerado.

Finalmente, eu gostaria de dizer que Silvio Santos foi tremendamente injusto quando chamou Boni, numa entrevista, de “office-boy de luxo”. Nenhum office-boy consegue guardar tanto rancor no coração
". Jornal do Brasil, 30 de abril de 1988

O mesmo seria lido por ele, ao vivo, no dia seguinte, durante a entrega do Prêmio Imprensa.

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