Os Heróis da Casa Rosa
Bem assim é uma cidade. Ela não
existe simplesmente por suas ruas, prédios e praças. O espaço físico tem muita
importância, mas uma cidade é constituída também pelos moradores, por sua
história, sua arquitetura, sua natureza, sua música, sua poesia. Uma cidade tem
alma e memória.
Muitos crimes já foram cometidos
nessa sacrossanta e belíssima cidade de Nossa Senhora dos Prazeres contra seu
patrimônio e sua beleza.
Deviam ir para cadeia os responsáveis por
crimes ambientais e urbanos que foram cometidos em Maceió. De relance, cito
algumas atrocidades cometidas, que me vêm à mente, nesse momento:
1- O
baque e morte do Gogó da Ema, coqueiro com suas curvas parecidas com o pescoço
de uma ema, que foi e ainda é o símbolo das Alagoas.
2- A
demolição da cadeia publica da Praça da Independência.
3- A
doação da Praça 13 de maio para o SESC construir uma sede.
4- A
doação de uma praça na Av. João Davino para construção do Clube dos Sargentos e
de um edifício de apartamentos que foi comercializado.
5- A
demolição do Hotel Bela-Vista, patrimônio arquitetônico.
6- A
doação da Praça Napoleão Goulart ao Clube Fênix Alagoana, o mais rico da
cidade.
7- A
praça D. Rosa da Fonseca para o Bar do Chope no centro da cidade.
8- Deixar
cair por falta de cuidados os “7 Coqueiros da Pajuçara”
9- Doação
do Gramado da Pajuçara para um posto de combustível.
10- A demolição de alguns belos casarões de
Jaraguá, assim que as prostitutas saíram do bairro para a periferia. Foi
preciso a intelectualidade alagoana gritar para o bairro de Jaraguá ser
tombado.
Esses são apenas 10 crimes cometidos
que me vieram à cabeça no momento. Existem muito mais.
Além de crime contra nosso patrimônio,
nossas raízes, houve também o crime ambiental: doação de praças, áreas verdes.
Segundo a Organização Mundial de
Saúde – OMS –, para uma cidade para ser respirável, ter a quantidade mínima de
oxigenação, são necessários 12 m² de
área verde por habitante. Curitiba tem
50 m²/hab, João Pessoa tem 60 m²/hab. Segundo levantamento que fiz quando Secretário
no tempo do prefeito Guilherme Palmeira,
Maceió, mal chega ao ridículo 6(seis) m²/hab, conseqüência do péssimo costume
político em doar áreas públicas. Se não fosse a brisa do mar, e a topografia da
cidade, Maceió seria uma cidade muito mais quente.
Na primeira metade do século
passado, na praia de Pajuçara, a família Paiva construiu uma bela mansão. Na
minha juventude freqüentei festas nessa casa. Quando aparecia algum amigo ou
parente, turista amador daquela época, eu, com maior orgulho, mostrava a praia da Pajuçara e a mansão dos Paiva.
Aquela casa sempre foi referência
urbana, arquitetônica e orgulho de Maceió. Tempos depois ela passou de mãos,
foi sede do PRODUBAN; e por muitos anos, Secretaria de Turismo, ocupação bem
adequada.
Apesar do processo de tombamento da
mansão em andamento, um grupo de italianos, que nada tem a ver com nossa
comunidade, adquiriu a casa para construir um edifício de apartamentos.
Semana passada, quando iniciaram a
demolição, eis que surge um “Exército de Brancaleone” tendo à frente as
generalas: Lourdinha Lyra, Solange Lages, Carmen Lúcia Dantas, Leda Almeida, e
os Don Quixote: Douglas Apratto, Pierre Chalita e Francisco Valois. Num
primeiro momento conseguiram sustar a demolição da mansão cor-de-rosa.
Tomei conhecimento desse ato heróico pela
televisão, ainda emocionado pelo que vi na TV, agradeço a esses heróis da casa
rosa, em nome do povo de Alagoas, pela
intervenção corajosa e tempestiva.
Quero me alistar como soldado voluntário
nesse Exército, e lutar no que for preciso para conservar nosso patrimônio,
nossa memória.
Tenho admiração por Pierre Chalita,
pelos seus belos quadros, por seu insistente, incansável trabalho dedicado à
cultura alagoana. Depois que eu o vi na TV, numa cadeira de rodas, em frente à
mansão, anunciando num desafio, feito La
Passionara: “Não derrubarão!” Eu promovi Pierre a herói.
Pierre Chalita agora é, o HERÓI DA CASA ROSA.
P.S.
– Já havia escrito esta crônica, quando hoje me entristeci ao ler no jornal,
que, na calada da noite, os aventureiros italianos, uma carregadeira, e uma
liminar da Justiça, golpearam pelas costas nosso patrimônio. Demoliram a Casa
Rosa.
Que fazer? Resta apenas, oferecer esse
poema de Maiakowsky aos algozes da memória de minha cidade:
“Na primeira noite eles se aproximam,
colhem uma flor de nosso jardim e não dizemos nada... Na segunda noite eles não
escondem: pisam as flores, matam nosso cão e não dizemos nada... Até que um dia
o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua e conhecendo
nosso medo arranca-nos a voz da garganta...E por quê não dizemos nada? Já não
podemos dizer nada...”
Que os
escombros da casa rosa, se avermelhem, se transformem em brasas, que as brasas
se transformem em chamas e labaredas que acendam e inflamem as vozes, os gritos
de nossa cidade. Ainda podemos falar. E aqui vai nosso grito de dor e de
protesto por mais um crime contra nossa amada e bela Maceió.
Pajuçara perdeu mais uma referência, ainda
bem que o mar continua beijando as areias com mais alma e mais amor...
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