A rejeição crescente ao governo petista – e que gerou 51 milhões de votos para Aécio Neves nas eleições presidenciais – não se traduz necessariamente na escolha do PSDB como seu antípoda.
Aécio, que não é neófito em política, sabe que foi beneficiário de uma circunstância. O PSDB, idem. Saber aproveitá-la pode somar à carreira de ambos, mas, até que isso aconteça, o descrédito do sistema partidário coloca a todos no mesmo balaio.
Recente pesquisa do Datafolha mostrou que mais de 80% da população não se sentem representados por nenhuma sigla – e desconfiam de todas. Romper esse estigma depende de algo mais do que contar com a incompetência e o desgaste do adversário.
Depende de determinação e audácia, que têm faltado aos tucanos. Desde as eleições de outubro, o personagem que com mais firmeza enfrentou o PT é da própria base governista: Eduardo Cunha, do PMDB, que tem sido bem mais audaz que Aécio.
O PSDB, ao contrário, tem se mostrado negligente. No imediato pós-eleição, pôs em dúvida o sistema de apuração (chegou a ingressar no TSE com um pedido de auditagem das urnas) e denunciou o uso indevido (criminoso, diga-se) dos Correios em Minas Gerais, comprovado por diversos vídeos e pela confissão do deputado Durval Ângelo (PT-MG), na presença do presidente daquela estatal, Wagner Pinheiro, numa reunião do partido.
Nenhuma dessas denúncias, gravíssimas, prosperou. Não mais delas se falou, o que leva muitos a crer que, mesmo fundamentadas, talvez não o estivessem o suficiente. Ou, então, pior, teriam sido objeto de negociação com os infratores.
Há dias, Aécio disse: “Olha, eu não sou golpista, sou filho da democracia. (…) Não acho que exista nenhum fato específico que leve ao impeachment”. E condenou as manifestações de rua, que bradavam por aquela causa, deixando implícito que eram golpistas.
Os depoimentos até aqui conhecidos da Operação Lava-Jato mostram que a Petrobras não apenas foi saqueada numa escala sem precedentes, como seus recursos teriam financiado a campanha da presidente reeleita nas duas eleições (2010 e 2014).
Mesmo assim, o PSDB mede as palavras para se posicionar diante do escândalo. Com isso, os petistas ficam mais ousados – e, reconheça-se, jamais pecaram por tibieza. São peritos, ao contrário dos tucanos, em tomar iniciativas e em exercer o descaro.
Um exemplo: o ex-gerente da Petrobras, Pedro Barusco – o tal que se dispôs a devolver 100 milhões de dólares que recebeu como propina ao longo dos governos Lula e Dilma -, informou que o PT, pelas mãos de seu tesoureiro, João Vaccari Neto, levara 200 milhões de dólares de comissão em algumas obras.
Barusco era assessor de Renato Duque, diretor de Serviços da Petrobras, nomeado por indicação de José Dirceu. Os três – Vaccari, Duque e Dirceu – estão soltos.
O PT negou, ameaçou processá-lo e desqualificou-o moralmente como informante. Mas bastou que Barusco dissesse que também recebeu propina da empresa holandesa SBM Offshore ao tempo em que o PSDB era governo – mesmo ressalvando que se tratava de transação direta entre ele e a empresa corruptora – para que, subitamente, o PT e a presidente da República passassem a lhe dar crédito.
Dilma, depois de um longo sumiço, valeu-se da declaração de Barusco para afirmar, com uma cara de pau espantosa, que a culpa do que hoje ocorre na Petrobrás – com seus 88,6 bilhões de rombo decorrentes da corrupção, em 12 anos de petismo (Graça Foster diz que é mais) – é responsabilidade, vejam só, dos tucanos.
Se o PSDB, disse ela, tivesse investigado em 1997 aquela gorjeta de que falou Barusco, nada disso teria ocorrido. Ora, e o que, quanto a isso, fez o PT, em seu 12º ano no governo?
Não apenas não investigou, como montou uma estrutura criminosa, sistêmica e explícita, que sugou a empresa numa escala inédita na história humana, segundo o The New York Times.
O que o PT tem de cara de pau o PSDB tem de tíbio. Daí a desastrosa equação histórica a que o país está submetido.
As ruas já o perceberam. Já constataram que, se o país depender da virilidade tucana, nada acontecerá. Vencerá mais uma vez a cara de pau, como aconteceu ao tempo do Mensalão.
A ideia de que impeachment é golpe decorre de um de dois fatores: ou inapetência política em arrostá-lo ou ignorância jurídica – ou ambas. Não pode ser golpe algo que está previsto na Constituição e circunstanciado na legislação ordinária, já tendo sido acionado pelo próprio PT e PSDB contra o governo Collor, sem que o país tenha abdicado da democracia.
Aécio parece mais preocupado em zelar pela imagem de bom moço, rejeitando apoio conservador – embora desse segmento tenha recebido grande parte de seus votos -, que em correr os riscos que o momento histórico impõe. Não só ele, mas seu partido.
A História é implacável com os que não a percebem. Oferece oportunidades, mas é cruel com os que não as aproveitam.
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