Dor de dente nas costas
Ronald Mendonça
Médico e Membro da AAL
O que poderia haver de comum entre o ator americano Jeff Chandler, o
ex-craque Roberto Rivelino, o malsinado John Kennedy, o general
Figueiredo, o escritor Otto Lara Resende e mais milhões de brasileiros
pobres, ricos, brancos, negros e mulatos? Uma doença conhecida como
hérnia discal, responsável por grande parte do absenteísmo ao trabalho. Doença que sobrecarrega as previdências sociais do mundo inteiro.
Jeff Chandler era um sujeito imenso de quase dois metros de altura. Não
tenho grandes recordações de sua atuação como ator. Por um cacoete da
profissão, liguei-me ao seu prontuário médico. Tinha em torno de 40 anos
quando foi submetido a uma cirurgia de hérnia de disco, nos anos 60.
Uma infecção generalizada, adquirida no pós-operatório, teria sido a
causa do seu falecimento precoce.
O “Garoto do Parque”, referência
ao Parque São Jorge, ambiente onde floresceu o “cracaço” Rivelino,
apesar da sua consistência musculosa, também foi vítima desse problema.
De vez em quando ia para o estaleiro. Os jornais comentavam sobre uma
“ciática” recorrente, mal cuidada. As más línguas, palmeirenses ou
santistas, espalhavam que o canhoto de chute amedrontador “amarelava” e
inventava essa queixa.
JFK sofria desse mal. Como ninguém está livre
do comentário malsão, dizia-se, nem tanto à sorrelfa, que o presidente
americano, de tanto usar analgésicos em doses cavalares, teria uma
dependência química. Consta nunca ter sido operado. A musa Marylin
Monroe, uma das grandes paixões do líder, teria feito inconfidências
sobre as penúrias gravitacionais do casal nos momentos de maior
arrebatamento.
O colunista da Folha de São Paulo, Lara Resende, já
era um homem idoso quando decidiu operar-se de uma hérnia discal, no Rio
de Janeiro. Certamente a idade avançada contribuiu para o comemorativo
funesto.
O homem que preferia o cheiro das estrebarias ao do povo
sofreu pra caramba. O país acompanhou seu calvário. Figueiredo tentou
tudo. Do fisiatra oriental às curas espirituais. A definição de sua dor
reverberou mundo afora: “uma dor de dente nas costas”. Terminou no
bisturi do neurocirurgião. Cavalgar, nunca mais.
Somente dez por
cento dos portadores chegam à sala de cirurgia. A maioria convive bem
com suas hérnias. De quando em vez, há uma recorrência dolorosa
contornada com medicação sintomática e repouso. Às vezes, a infiltração
anestésica atua na contratura muscular, aliviando de forma passageira a
contratura e a dor.
A cura definitiva é obtida somente pela exérese
da lesão, por processo cirúrgico. Poucos centros no Brasil, por razões
óbvias, podem dispensar a presença do neurocirurgião. Alagoas não está
incluída nesse rol. O implante de material de síntese em hérnias simples
eleva custos e, sobretudo, riscos de maior morbidade.
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