Ricardo Setti
É uma barbaridade!
A Comissão de Justiça da Câmara
dos Deputados – justamente a comissão de JUSTIÇA – aprovou ontem um
projeto de emenda à Constituição que, se levado adiante, representará
nada menos do que um golpe de Estado.
Contrariando uma multissecular
tradição profundamente enraizada no Ocidente, contrariando o espírito da
Constituição, contrariando o bom senso e as regras elementares da
democracia, a emenda à Constituição pretende submeter ao Congresso
decisões da Justiça que declare leis como inconstitucionais.
Isso ocorrerá – se essa loucura
prosperar – sempre que o Supremo Tribunal Federal julgar procedentes as
chamadas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (Adin) propostas por
vários órgãos legalmente autorizados a isso.
Ou seja, deputados e senadores
serão quem decidirão, em última instância, se vale ou não vale o que
eles próprios aprovaram. Nesses casos, serão os juízes de si mesmos – em
detrimento dos direitos e garantias individuais dos cidadãos, cuja
garantia é a Justiça.
O Legislativo, sempre
controlado, como os demais Poderes, pelo Judiciário nas nações
civilizadas e decentes, será seu próprio controlador em determinados
casos – e se colocará acima do Poder Judiciário.
É um escândalo, é uma imoralidade.
Se aprovada a emenda, haverá
exceções, e exceções gravíssimas, ao princípio constitucional de que
todo ato praticado por agente público – e não apenas esses, mas todo ato
que gere consequências jurídicas – tem a GARANTIA de ser ou não, em
última análise, referendado pelo Judiciário.
É o Judiciário, nos países
civilizados, o supremo guardião das garantias constitucionais, que
compreendem todos os direitos e garantias individuais – o direito de ir e
vir, o direito à livre manifestação, o direito à livre expressão do
pensamento, o direito de associação… Todos os fundamentos de uma
sociedade livre e civilizada.
É o Judiciário, nos países
civilizados, pelo menos desde os primórdios da República fundada nos
Estados Unidos no século XVII, quem exerce o controle da
constitucionalidade das leis.
Em certos países, como os
próprios Estados Unidos, o papel cabe à Suprema Corte. Outras nações
democráticas e civilizadas, como a Alemanha ou a Espanha, mantêm um
Tribunal Constitucional específico, ao lado de uma Corte Suprema, que
determina se leis aprovadas pelo Legislativo estão ou não de acordo com a
Carta de Garantias, a Constituição.
O autor da emenda autoritária e imoral: o desconhecido deputado Nazareno Fontenele (PT-PI)
De todo modo, esse papel nobre cabe sempre ao Judiciário, um dos Poderes independentes do Estado.
A emenda propõe mais barbaridades, entre as quais:
* Sobe para quatro quintos o quórum para o Supremo declarar uma lei inconstitucional.
* Proíbe que ministros do
Supremo concedam liminares em mandado de segurança para suspender – até o
julgamento final pela Corte – a eficácia de emendas constitucionais.
* Determina que as súmulas de
jurisprudência vinculantes (mecanismo editado pelo STF que deve ser
seguido por todas as instâncias do Judiciário, com base em decisões
repetidamente adotadas pela corte – mecanismo destinado a agilizar a
Justiça)) também serão submetidas ao crivo do Congresso antes de entrar
em vigor.
Como ocorre com muitos dos
trabalhos “sujos” no Congresso, a emenda foi originalmente apresentada
por um deputado medíocre, obscuro, de quem ninguém nunca ouviu falar –
um certo Nazareno Fonteles, do Piauí (e do PT, é claro!). Ele alcançará,
agora, seus 15 minutos de fama, exercendo esse triste papel.
Como a base parlamentar aliada
ao governo Dilma está apoiando essa monstruosidade, parece, mesmo, ser a
retaliação contra o Supremo prometida pelo ex-presidente da Câmara
Marco Maia (PT-RS).
Querem castrar o Supremo!
Querem amordaçar a Justiça!
Querem se vingar pelo fato de a corte ter cumprido a Constituição e as leis e enviado os mensaleiros para a cadeia.
Já dominam o Legislativo com os
métodos que todos conhecemos. Agora, querem que esse Legislativo, que
controlem, dominem também o Judiciário.
A democracia estará ameaçada com esse golpe de Estado branco se ele seguir adiante no Congresso.
Os homens de bem da Câmara e do
Senado, de todos os partidos – e, não tenham dúvida, eles existem –
estão com a obrigação cívica de se oporem a esse ato ditatorial.
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