sábado, 10 de outubro de 2015

UM TEXTO DE MARCOS DAVI MELO

O TCU E O CONGRESSO

Marcos Davi é médico, escritor, membro da AAL e IHGAL.

Quando em 1512 Maquiavel escreveu Discursos sobre a Primeira Década de Tito Lívio, inspirou-se no que acontecia em sua época e no meio em que vivia,como em sua arguta observação do ser humano e da História. Mas jamais imaginaria que séculos depois, em um distante e inimaginável País, sua obra influenciaria tanto uma apreciação de contas de um governo por um tribunal pago pelo contribuinte, especificamente para que controlasse os abusos nos gastos governamentais, sangrando o contribuinte.
Maquiavel, um cético, mas não um cínico em relação ao comportamento humano, escreveu nos Discursos: “E onde uma coisa por si só se faz bem sem leis, a lei não é necessária; mas quando falta esse bom costume, logo se torna necessária a lei”. Felizmente, aqueles que nos legaram a Lei de Responsabilidade Fiscal, um dos maiores trunfos da democracia brasileira em todos os tempos, conheciam o pensamento de Maquiavel.

Dessa forma, por unanimidade, o TCU, em histórica e pedagógica sessão, baseado em uma análise irretocavelmente técnica, rejeitou as contas de 2014 do governo Dilma Roussef. Em análise posterior, o respeitado jurista e ex-petista Hélio Bicudo registrou: “O relator do processo Augusto Nardes fez um estudo aprofundado das contas do governo e expôs claramente os delitos da presidente,que incluem as ‘pedaladas fiscais’ e os decretos à revelia do Legislativo. A aprovação das contas de 2014 da presidente Dilma seria um nonsense absoluto. Se fosse uma análise meramente técnica, a presidente Dilma já estaria impichada, mas a análise e o julgamento final dependem do Congresso, que é um animal político”.

Bicudo enaltece que o TCU cumpriu sua missão constitucional exemplarmente, legando ao Congresso o seu irretocável parecer técnico, mas alerta que a palavra final será política e, receia, animalesca. Como, aliás, ocorreu essa semana, quando a distribuição de ministérios e benesses pelo governo não lhe garantiu nem quórum adequado para aprovar seus vetos.

Como o Congresso vai apreciar o histórico e pedagógico parecer do TCU? A população brasileira não lhe faz muita fé. Não espera dele atos de grandeza nem de cidadania. Todavia, se os parlamentares estiverem atentos à sua própria sobrevivência e sintonizados com a opinião pública, observarão um País ávido por ética e moral, sequioso de posturas como a preconizada por Malraux: “ Não se faz política com moral, mas também não se faz mais sem ela”.

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