domingo, 12 de abril de 2015

UM TEXTO DE LUIZ OTÁVIO CAVALCANTI - JORNAL DA BESTA FUBANA


SEMANA PASSADA

Nesta semana, que finda, o regime político brasileiro mudou. Sem ruído. Sem alteração constitucional. Sem debate público. Apenas com prática política. O regime político brasileiro, agora, é o Parlamentarismo. Parlamentarismo peemedebista.
A mudança foi entronizada, na rotina congressual, por dois ases da política brasileira: Renan Calheiros e Eduardo Cunha. Ignorando uma rainha de copas, sem heráldica e sem súditos: Dilma.
A crise econômica juntou presidencialismo de cooptação e incompetência. E os jogou na panela ardente do PMDB em óleos de apetite voraz. Que os refogou na culinária experiente que traça adversários com curtos acenos. E longa arte.
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O governo Dilma acabou. Sai o PT e entra o PMDB. Com dois primeiros ministros: Renan e Eduardo. Eles fazem a agenda parlamentar. Eles definem o que será aprovado na República. Eles pautam a ordem do dia na Câmara e no Senado. Eles estabelecem a prioridade na votação do Congresso.
O PMDB aguentou calado, durante quatro anos, ostensivo desprezo da presidente. Sem ser convidado para participar das reuniões estratégicas no Palácio do Planalto. Olimpicamente ignorado por uma presidente sem gosto pra política.
Mas, a crise fiscal abriu as portas do poder aos peemedebistas. Que encontraram um governo com outra cara: um egresso da Escola de Chicago, na Fazenda, e o presidente do seu Partido, Michel Temer, na articulação política.
Alguém imaginava tal cenário? Temos, então, três lideranças peemedebistas administrando os votos que deram vitória ao PT. O eleitor elegeu Dilma. E os eleitos entregaram, na bandeja dos incompetentes, a gestão ao PMDB.
Gente, não precisa gritar pelo impeachment da presidente. Até porque não há base legal para tanto. Na verdade, ela já está impedida pelos fatos políticos que a amputaram duplamente: na gestão econômica, conferida ao Mão de Tesoura, Levy. E na gestão política, atribuída ao chef du cuisine, Temer.
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A semana também mostrou um deserto. Faltam, no horizonte próximo, líderes vestidos de credibilidade para dar cadência ao concerto político. As duas últimas lideranças nacionais encontram-se em posições distintas: o ex presidente Fernando Henrique, no recato de aposentadoria lúcida; e o ex presidente Lula, um agitador de antigas massas que perdeu o senso do decoro.
Vejamos: na eleição de 2014, Dilma teve 54.501.118 votos. Aécio teve 51.041.155 votos. E votaram nulo e branco, 37.275.085 eleitores. Não é pouco.
Quase 40 milhões de brasileiros não se sentiram animados nem com a proposta de Dilma nem com a de Aécio. Esses brasileiros não querem Bolsonaro nem a volta dos militares. Mas também não querem a violência de Stedile nem a corrupção do mensalão e da Petrobras.
São milhões de brasileiros que se encontram na orfandade política. Que não se acham representados nem pelo PT nem pelo PSDB. Em 2018, os brasileiros de direita vão votar Aécio? E, os de esquerda, vão votar Lula? Não há nenhum outro nome que empolgue e faça campanha sem a fragilidade e os erros de Marina?
O PT sequestrou a ética no cofre do Partido. O PSDB encerrou a energia democrática de Covas na burocracia partidária. Não há projeto de Nação em discussão por nenhum partido. O que há é política menor de criar siglas para negociar cargos e arrecadar dinheiro. E uma irrelevante fusão entre PTB e DEM. Vejam só…
Agora, não se pode, nem se deve, alimentar ódio. Porque esta não é a vocação do povo brasileiro. Nem é a destinação da política. Tempo, e talento, hão de gestar futuro mais promissor.
* * *
Figura da semana – Charles Baudelaire
CBD
Nascido em 1821, em Paris, França, Baudelaire foi um dos fundadores da poesia moderna.
A comunhão entre emoção e rigor formal de sua poesia não escondia a mente atormentada do homem. Era dono de rara sensibilidade estética. E exercia feroz senso crítico consigo mesmo e com os outros. Sua angústia não tinha repouso.
Foi o poeta do tormento humano. Tinha gosto pelo inalcançável. Mas não dispensava o dandismo que o fazia imitado. Para ele, “tudo que é natural é abominável”. Sua busca do absoluto foi interditada pela visão da Queda. Vivia entre polos de tensão. E a unidade da paz interior esteve para ele sempre perdida.
Padeceu de sífilis e conviveu com o absinto. Morreu em 1867 nos braços da mãe.
Este trecho de Canto de Outono está nas Flores do Mal:
“Amo em teu longo olhar a luz esverdeada,
Doce amiga, mas hoje amarga-me um pesar,
E nem o teu amor, o lar, a alcova, nada
Vale mais do que o sol raiando sobre o mar.
Mas ama-me assim mesmo e cheia de ternura,
Sê mãe para o perverso, o ingrato em todo caso;
Sê, amante ou irmã, a efêmera doçura
De um outono glorioso ou a de um sol ao acaso.”
Até a próxima.

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