quinta-feira, 5 de junho de 2014

UM TEXTO DE ALBERTO ROSTAND

A FLECHA DO ÍNDIO
Alberto Rostand Lanverly
Membro das Academias Maceioense e Alagoana de letras e do IHGAL
       
Nossa vida encontra-se sedimentada em emoções renovadas a cada instante. São informações, às vezes portadoras de alegrias mas que, também, a depender da situação, nossos olhos e ouvidos absorvem, de forma tão brutal que dali o sangue parece jorrar.
            Quando a cor de prata vai calmamente se esparramando nos cabelos, o ser humano imagina já ter amealhado experiência suficiente para saber um pouco de quase tudo, principalmente se somos brasileiros que, se por um lado acreditamos no país onde vivemos, por outro estamos convictos de ser preciso muito amor à pátria para, de forma categórica, possuírmos ojeriza à forma como a mesma é gerenciada.
            Semana passada assistia o noticiário nacional, quando vi que um índio, utilizando o arco que trazia nas mãos, disparara uma flecha contra um policial, montado em um cavalo. Em época da cibernética, dos drones e das armas químicas, imaginei que ocorrera uma pane em meu aparelho de televisão e, de um momento para outro, um filme antigo ocupara a tela. Infelizmente logo constatei que aquele fato acabara de ocorrer, em Brasília.
            Terminados os informes, deitei-me na varanda e enquanto admirava o céu, todo estrelado, oferecendo uma baita visão à noite, confesso haver ficado perdido, olhando para o alto, com a impressão de que estava caindo, só que para cima, no imenso abismo do escuro infinito sobre mim. E a figura do indígena  não deixava minhas retinas.
Nos idos de 1500, época da chegada dos desbravadores a nosso país o convívio dos nativos com os portugueses foi relativamente harmonioso. Os tempos passaram... Hoje, por culpa do próprio governo, os índios foram praticamente exterminados. Vivendo, na grande maioria, em pedaços de terra sem a mínima estrutura, ganham a vida coletando migalhas de uma FUNAI que, como quase todo órgão público nacional, deixa muito a desejar, não lhes oferecendo a dignidade que merecem.
A flecha lançada pelo indígena, contudo, é emblemática, deixando claro que o povo brasileiro está, cada vez mais, entregue à própria sorte. Quando se imagina haver visto de tudo, aparece um doleiro depositando milhões nas contas dos que gerenciam a nação, enquanto as autoridades se consideram intocáveis, negligenciando tomadas de decisões que venham, definitivamente, retirar o Brasil da época do faroeste, onde caciques e pajés eram figuras de destaque na luta contra a cavalaria.
Tudo isto fortalece uma casta de inconsequentes, bloqueando estradas, queimando ônibus, estuprando e transformando em prisioneiros a grande maioria de racionais que só quer viver sem medo, tendo respeitado seu  direito de ir e vir.
Uma coisa é certa. Os olhos sintomáticos de pessoas más, que ora administram o Brasil, me arranham e me incomodam. Após muito pensar, a figura do índio me deixou, virou-se e foi embora, dissolvida na escuridão. Só assim, tive forças e energia positiva para me inteirar das outras novidades  promovidas pelo traquinos, que aí estão, envidando esforços para enfraquecer os pontos positivos de nossa história.

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