AMOR NOS TEMPOS MODERNOS
Por volta de duas da manhã Marlene acordou-se, o marido
estava deitado olhando para o teto, ela virou-se, enrolou-se, ajeitou o
travesseiro, resmungou.
- Eduardo, vá
dormir. Apague a luz.
Ele foi ao banheiro, tomou uma pílula, deitou-se
novamente, só assim conseguiu dormir.
Desde essa noite Marlene percebeu mudança em seu comportamento, mulher
tem sexto sentido apurado. Passou-se uma semana, Eduardo parecia em outro
mundo, quase não falava sobre o trabalho, seu bom humor acabou-se de repente. A
desconfiança chegou à cabeça da esposa. É outra mulher, pensava. Dudu bom de
cama há duas semanas sem sexo, muito estranho. Marlene sempre destemida quis
esclarecer aquela situação, discretamente fez uma pesquisa no celular do marido,
as mulheres da agenda eram conhecidas, restante nome de homens, andou
telefonando sutilmente para amigos e amigas tentando sentir alguma pista do que
havia acontecido ao marido. De concreto nada a concluir, Marlene continuou
desconfiada.
Na época viajaram com amigos para Montevidéu e Buenos
Aires, ele falou em desistir da viagem, entretanto, Marlene teve pulso forte,
tomaram o avião, se divertiram durante a semana santa ao sul da América do Sul.
Em certo momento, durante um show de tango, Eduardo voltou a ficar distante.
Ao retornar do passeio, Marlene conversou com franqueza.
- Dudu, eu não sou menina boba, está acontecendo alguma
coisa séria em sua vida, eu mereço no mínimo consideração, seja o que for, sou
mulher forte, tenho certeza que aguentarei, só não suporto a mentira, a
traição. Diga, existe outra mulher? Você está apaixonado por alguém? Tenho o
direito de saber, cedo ou tarde eu descubro, sua cara triste e distante não
deixa mentir.
- Marlene eu lhe garanto não é mulher, tenha certeza,
estou passando por uma fase de depressão, talvez seja a idade, me esforço para viver
normalmente, entretanto, parece existir uma força estranha me dominando.
- Você precisa de ajuda médica, a depressão tem
tratamento.
- Eu tenho me consultado com o doutor Omar toda semana. Quero
enfrentar a depressão sem tomar medicamento.
Marlene se satisfez com a história contada, contudo, o
marido parecia ter nojo em tocá-la. Os dois muito ativos sexualmente, estavam
três meses sem um carinho, ela não se conformava. Certa tarde Marlene recebeu
um telefonema do Dr. Omar, o médico pedia seu comparecimento na próxima
consulta do marido.
No dia marcado Marlene se aprontou. Eduardo, nervoso, mal
humorado, transparecia medo, terror desse encontro, notava-se fragilidade no olhar,
nos gestos.
Ao chegar no consultório Eduardo entrou sozinho, após
cinco minutos a atendente pediu para Marlene entrar. Encontrou os dois juntos
sentados no sofá, ela acomodou-se numa poltrona em frente. O médico foi
contundente ao falar.
- Marlene, o que vou revelar vai abalar muito sua
estrutura psíquica, você está preparada para ouvir?
- Quero saber tudo sou uma mulher forte, quero saber o
que está se passando.
- A grande verdade é que Eduardo só descobriu na
maturidade o outro lado do ser, quase idoso desflorou sua homossexualidade
incubada. Com o passar do tempo durante as consultas, Eduardo pode abrir seu
coração. Eu me envolvi muito com seu drama. Descobrimos enfim, estamos
apaixonados um pelo outro, queremos sua compreensão e o divórcio.
Omar segurou a mão de Eduardo, abraçou-o de lado,
enquanto Marlene perplexa ficou sem ação no momento. De repente levantou-se, chorando,
urrou de raiva, bateu a porta.
Hoje os dois estão vivendo juntos. Marlene, para amenizar
o impacto do término de 32 anos de casamento de maneira inusitada e inesperada,
está conseguindo aceitar a situação graças à terapia constante de uma
psiquiatra famosa e competente.
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