sábado, 11 de fevereiro de 2012

UM TEXTO DE RONALD MENDONÇA



QUEM TE VIU QUEM TE VÊ...

RONALD MENDONÇA
MÉDICO E MEMBRO DA AAL


Por alguns momentos, imaginava-se que os cânceres que habitaram os corpos de dona
Dilma e de Luiz Inácio trariam benefícios para a Saúde do restante da população.
Acreditava-se, ingenuamente, que a perspectiva de uma breve finitude os sensibilizaria
além das habituais verborreias demagógicas.
A inércia continuou, por razões que todos compreendem: foram recebidos como reis
num dos melhores hospitais do país, por equipes que beiravam a vassalagem. Em
nenhum instante, sentiram o gosto amargo de encarar o “CORA”, sigla maldita para
escamotear interminável fila para consultas. Exconjurado o perigo, por que a dupla
iria se preocupar com esses rebotalhos de hospitais credenciados, preços de diárias,
honorários de médicos, “essa elite burguesa”?
Aliás, nesse Carnaval madame Rousseff está impagável ao se dizer “estarrecida” com
os diálogos dos grevistas baianos. A presidenta não está só nesse repúdio. Quando não
impera o silêncio e a indiferença, jogando no lixo todo aquele histórico de terrorismo,
luta armada, greves etc, companheiros têm manifestado horror ao movimento paredista
baiano. Quem te viu, quem te vê...
Bandeira branca, amor. Esta semana, a Unidade de Emergência de Arapiraca teve seus
minutos de glória ao salvar a vida do jovem Nivaldo Neto, filho do deputado Antonio
Albuquerque. Ninguém está imune às desgraças. Pelo êxito, o orgulho é inevitável,
embora todos saibam que a matéria prima do hospital é feita de órfãos da sorte.
O fato é que as autoridades alagoanas, fugazmente, fixaram o olhar na UE, e devem
estar deveras estarrecidas como um hospital acanhado, incrustado no coração do
agreste, consegue tanto. Com boa remuneração e uma tecnologia de ponta ao dispor, é
fácil operar no Sírio-Libanês.
Complicado, gestores e leitores, é abrir uma cabeça com um foco cirúrgico que
vagueia indócil e caprichoso, e que pára onde quer. É sugar um coágulo com um
aspirador do século 19; é estancar uma hemorragia com instrumental que não é
renovado, sucateado, desafios permanentes à habilidade e paciência. Forçados a
improvisar, somos quase gênios.
Até quando a indiferença? Há dias em que não há certas especialidades. Os
neurocirurgiões das UE de Maceió e Arapiraca, por exemplo, estão sem reajustes há
quatro anos. Ninguém toca no assunto. Humilhados pelo aviltamento, muitos estão
deixando os plantões. Se alguém fala em parar o atendimento, logo nos mostram o
Juramento de Hipócrates e nos chamam de mercenários.

Um comentário:

  1. Uma realidade nua e crua, pra não dizer "viva e cozida" tal qual a nossa tolerância.
    Parabéns pela matéria, a literária.

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