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sábado, 31 de março de 2018

HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA - Carlito Lima


ENQUANTO VOCÊ DORMIA

     - Doutora, na verdade estou cansada do Renato, me abusei da vida casada. Casei-me cedo aos 21 anos, hoje com 28 ainda me sinto jovem, meu marido passa a noite em casa assistindo novela e jogo de futebol. Sem filhos, minha vida é um tédio, acabou a alegria do casamento. Quando fazemos amor é burocrático, obrigatório. Confesso, já tive vontade e oportunidade de traí-lo, entretanto, não faz minha cabeça, tenho forte sentimento de respeito, quero apenas meu marido como era antes. Oriente-me, por favor!
A doutora Fernanda da Silveira olhou para Maria Alice, pigarreou discretamente, com fala bem compassada deu sua opinião.
- Minha querida, você está passando pela crise dos sete anos, todo casal tem esse problema. Está na hora de temperar esse casamento, a cama é ótima para reorganizar uma vida a dois. Faça uma surpresa, no fim de semana você convida o marido para assistir a um bom filme, alugue um com cenas quentes de sexo. Compre três garrafas de bom vinho, vista um lingerie sensual, e vamos ver no que dá.
Um mês depois Alicinha retornou radiante, satisfeita da vida.
- Doutora foi um santo remédio, não havia acabado a segunda garrafa de vinho, nem terminado o filme, nós já estávamos abraçados no tapete, tudo como antigamente. Renato adorou, no sábado ele saiu para escolher o filme, a senhora salvou meu casamento. Ele está interessadíssimo, comprou até o Kama Sutra para praticarmos posições durante as sessões de cinema.
Passaram-se alguns meses, Maria Alice retornou à psiquiatra. Entrou nervosa.
        - Doutora, desde aquela época nós estamos praticando experiências novas na cama, coisas que jamais pensei fazer, eu adorando. Acontece que Renato me perguntou se eu já tinha ouvido falar em swing, eu pensava ser um ritmo de música. Ele sorriu e explicou: “Existe aqui no Rio de Janeiro o Clube de Swing, entretanto, não é para dançar, esse swing é a troca de casais. Os casais se encontram conversam, bebem, quebram o gelo, depois cada qual arrasta a mulher do outro para o motel. Quando termina é como nada tivesse acontecido.” Continuou: “Nós dois já fizemos todas as experiências que imaginávamos. Será que você toparia fazer essa novidade?” Eu fiquei chocada, sem saber responder. Não é um procedimento correto, ético, mesmo que o casal esteja em crise conjugal. Comecei a achá-lo um grande salafrário, me trocar, saber que eu vou com outro homem que mal conheço. Isso é degradante. Que decepção. Estava tão bom o Kama-Sutra, me ajude doutora.
- Querida Alicinha, para algumas pessoas a traição é relativa, é o caso de seu marido aceitar a troca de casais, já para você é inconcebível pela sua formação moral, intelectual e ética. Embora eu seja sulista, conheço bem os padrões rígidos da educação nordestina, porém, a decisão é sua. Nada posso aconselhar. Faça o que seu coração mandar.
   Na sexta-feira à noite Renato voltou a insistir no swing.  Era a evolução dos costumes, dos casais modernos. Alice constrangida, com o coração apertado aceitou a proposta, só para satisfazê-lo. Foram ao Clube do Swing, tomaram uma mesa, pediram uísque, Alicinha nervosa e chateada. Logo apareceu um casal pedindo para sentar. Muita conversa, Renato estava radiante quando viu a bela mulher da troca. O marido também era um cara bonito. Beberam muito, conversaram, sorriram, até que chegou a hora da troca. Alice com o coração aos pulos. Ao entrar no quarto do motel ela caiu no choro, pediu desculpas ao parceiro, não quis de jeito nenhum. O parceiro educadamente mandou-a continuar chorando, compreendia, era a primeira vez. Ele foi elegante não se sentiu ludibriado. Levou Alice para seu apartamento em Copacabana.
   Ela agradeceu ao cavalheiro. Em casa ficou contemplando o mar, pensando. Três horas depois chegou Renato satisfeito da vida, perguntando. Que tal? Gostou? Alice teve nojo do marido, vontade de jogar-lhe um vaso na cara. Cansado ele vestiu o pijama e deitou-se. Enquanto o marido dormia, ela arrumou três malas, tomou um taxi para o aeroporto. Pegou um avião, retornou para sua querida cidade.
Ficou um tempo no apartamento dos pais que lhe deram todo apoio. Alicinha está solteira e feliz, é vista nos bares bem frequentados pelas mulheres mais descoladas da cidade. Vez em quando, em seu pequeno apartamento, ela oferece um bom vinho a algum parceiro, assistindo a um bom filme. Outro dia Renato telefonou, ela foi taxativa, jamais voltará. Ele quis saber em que momento ela decidiu a separação e viajar de repente. Alice respondeu simplesmente. “Enquanto você dormia.”


1ª FESTA LITERÁRIA DO GRACILIANO RAMOS - 1ª FLIGRAÇA - 25 A 28 DE ABRIL

1ª FESTA LITERÁRIA DO GRACILIANO RAMOS de 25 a 28 de abril. com ótimas palestras, mesas de debates, sarau poético, feira de artesanato, cultura popular, concertos musicais, folclore, feirinha de livro, muita literatura prazerosa no auditório da Associação de Moradores, na Praça e nas Escolas. Tudo gratuito para o povo. O convite é para a população de Maceió vá divertir-se a aprender na 1ª FLIGRAÇA. Levem seus alunos, suas escolas. O conjunto Graciliano ramos fica logo depois do Shopping Pátio.

HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA - Carlito Lima


DEVIA TER DADO

- “Eu devia ter dado.” Ritinha confessava, em soluços, abraçada à amiga Miriam, sentadas num banco do cemitério Parque das Flores. Era quase meia-noite o corpo de Afrânio estava sendo velado pelos amigos e parentes.
Afrânio aparentava boa saúde, caminhava diariamente às 17 horas pela orla. Naquela tarde Afrânio, andando, sentiu um mal estar, dor no peito, caiu no chão. Socorreram, colocaram-no em um taxi, avisaram à Paula, sua esposa, levaram o infartado ao Hospital, ao chegar estava morto. Foi uma choradeira entre parentes e amigos, os dois filhos que moram em São Paulo pegariam o primeiro avião. A notícia correu rápida no Facebook, postaram o laço preto, a foto e as notícias fúnebres elogiosas. “Alagoas fica menor. Morre Afrânio Cavalcanti grande empresário, o velório será o Parque das Flores e o enterro às 17 horas de amanhã.” Afrânio era muito querido, gentil, trabalhador, bem casado, tinha apenas um defeito, gostava de um rabo de saia. Teve vários casos, mas nunca se prendeu a alguma de suas aventuras. A esposa minimizava esse defeito para viver bem.
O Parque das Flores logo ficou repleto, as duas amigas Paula e Ritinha abraçadas diante do caixão choravam em desespero aquela tragédia, os amigos consolavam a viúva. Foram 31 anos de casados, eles viviam em harmonia possível. Quando os filhos foram para o Sul estudar e ficaram por lá, o casal ficou mais amigo, precisavam um do outro. Paula chorava aos prantos diante do marido inerte no caixão, sabia que nunca mais teria seu bom humor, seu carinho e as noites gostosas de amor, afinal, Afrânio era sábio de cama.
Deram um calmante à Paula, ela deitou-se nos aposentos do velório. Ritinha acordada aguentou no salão olhando para o defunto, estava chocada, desesperada, arrependida, havia descoberto naquele momento doloroso que amava Afrânio, marido de sua melhor amiga, sua cabeça pensava em perda, lamento e traição, quando apareceu a amiga Miriam convidando-a a um passeio pela alameda iluminada do cemitério. Sentaram-se no banco embaixo de enormes pés de eucaliptos. Foi naquele momento que ela desabafava junto à amiga.
- ”Eu devia ter dado a ele.” Continuou abrindo seu coração para Miriam.
- “Eu e Paula sempre fomos grandes amigas. Depois que me separei do Arnaldo, comecei a sair com o casal, Afrânio cheio de bom humor vivia me arranjando namorado, até que dei algumas escapulidas com alguns. Ano passado na praia de Paripueira em um passeio na piscina natural, eu estava segurando a jangada com o corpo dentro d’água, de repente, senti um corpo junto ao meu por baixo d’água, entrelaçou-me entre as pernas, deu-me uma gostosa excitação, olhei nos olhos de Afrânio e balancei a cabeça negando amavelmente. Aquele momento me agradou confesso, eu adorei. Dias depois me encontrei com Afrânio no Shopping, ele convidou-me para um sorvete. Sentamos, ele perguntou se eu acreditava que um homem podia amar duas mulheres? Porque me amava e era tarado por mim. Já pensou? Eu quase sessentona. Mandei que ele se aquietasse, já não era mais menino, não ligou, continuou a conversa. Fez-me a proposta indecente. Por que não um encontro em vez em quando num motelzinho gostoso? Não precisava Paula saber.
 Eu saí do Shopping excitada com a proposta, porém, havia uma amiga no meio do caminho. Afrânio quando podia, dizia-se apaixonado, eu resisti durante esse tempo todo. Hoje eu o vendo morto, inerte, a vida acabada, fiquei num profundo sentimento de perda e de arrependimento. Eu devia ter dado a ele, Miriam. Agora Inês é morta”.
Retornaram ao velório, Ritinha procurou Paula, ela estava sozinha no quarto, sentada na cama, deu duas batidas no colchão com a mão, convidando a amiga sentar-se. Abraçaram-se.  A viúva puxou conversa.
- “Minha querida amiga, Afrânio gostava muito de você, muito mesmo, eu não sentia ciúme. Ele lhe tinha um carinho especial, eu percebia. Agora que tudo acabou, diga-me, até por curiosidade, continuarei sua amiga seja qual for a resposta. Vocês transavam?”.
Deu-se um momento longo de profundo silêncio.
- “Paula vou lhe contar a verdade, fui-lhe amiga fiel com muito esforço. Afrânio tentou, tentou muitas vezes, insistente. Confesso várias vezes tive vontade, só não dei, para não lhe trair”.
- “E eu pensava que vocês transavam. Você devia ter dado, o bichinho queria tanto.” Disse Paula sorrindo, beijando a testa da amiga.