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sexta-feira, 31 de julho de 2015

UM TEXTO DE RONALD MENDONÇA

VERMES

RONALD MENDONÇA
MÉDICO. MEMBRO DA AAL

Diferentemente dos americanos que, de quando em vez,têm um presidente assassinado,  a maior tragédia que os brasileiros sentiram na carne foi o suicídio do presidente Getúlio Dornelles Vargas, em 24 de agosto de 1954. Na verdade, nós temos PhD na convivência com presidentes amorais.
Guardo algumas incertas lembranças. Era uma manhã chuvosa.  Meu irmão Robson e eu pegamos o ônibus, quase na porta da nossa casa, em Bebedouro, onde residíamos. Ao chegarmos no Colégio Diocesano tomamos conhecimento do fato. Não tínhamos ligações com a política.
Meu pai não era getulista. Ele detestava ditaduras e as arbitrariedades delas decorrentes. (Aprendi com ele muito do que hoje é o meu modo de pensar.) Por isso, conhecia muito mais a figura do Getúlio pelas fotografias nos estabelecimentos comerciais do bairro. Ouvira, algumas vezes, algum discurso seu (talvez pela “Voz do Brasil”), facilmente identificável pelo jargão “Trabalhadores do Brasil...
Com o tempo, o suicídio de Getúlio passaria a ser focado do ponto de vista psiquiátrico e humano. Com efeito, o organicista Zé Lopes pensava considerar o inopinado e brutalepílogo como algo quase esperado numa biotipologia pícnica. A morte com direito a “carta-testamento”quase o beatificara.
Sem o refinamento kretshmeriano do meu saudoso pai, detenho-me nos historiadores idôneos. Para estes, os discursos do parlamentar Afonso Arinos de Mello Franco foram muito mais (ou tão quanto) demolidores que os artigos do ex-comunista Carlos Lacerda. Aliás, Mello Franco ficaria tão traumatizado com o suicídio do seu adversário que ordenou retirar, dos arquivos do Congresso, seu último explosivo discurso, proferido um dia antes da tragédia.
É risível quando alguém quer emparelhar a moral de um Getúlio Vargas,a de uma Dilma Rousseff ou de um Luiz Inácio. Tento imaginar Vargas recebendo notícia dos desfalques na Petrobrás.  O fato é que o tumulto político que precedeu o dramático desfecho teria sido de dolorosas descobertas para o velho caudilho. Num dado momento, coberto de vergonha (GV tinha vergonha na cara), confirma as tramoias do próprio filho e dos que o cercavam.

Testemunhas relataram seus silenciosos prantos nas janelas do Catete. O mito desabara. Acabrunhado, o emérito frasista, contudo, ainda resistia. Pobre Vargas. Cunharia estar cercado por um “Mar de Lama”. Sabia como livrar-se dos inimigos.Não estava nos seus planos voltar de São Borja para conviver com tantos vermes a seu redor. 

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