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quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

UM TEXTO DE NADO TORRES - FOLHA DA BARRA

Im(p)unidade parlamentar


por Nado Torres/Revista Folha da Barra


A instituição da imunidade parlamentar é, além de uma conquista, um inegável avanço para uma sociedade que se quer democrática. Protegido por ela, um vereador, um deputado – estadual ou federal –, ou um senador tem a garantia de que não será condenado por suas palavras. Somente em regimes de exceção, como foi a Ditadura Militar implantada no Brasil em 1964, o parlamentar é obrigado a calar.

A imunidade foi, por exemplo, a justificativa para que o governo militar tirasse de seu saco de maldades os presentes e os distribuísse à democracia em dezembro de 1968. Bastou o discurso do então deputado Márcio Moreira Alves e seus desdobramentos para a ditadura arranjar um pretexto e, depois, fechar o Congresso, prender lideranças e perseguir quem falasse contra. Eis o significado de imunidade – garantia de falar sem ter ameaça de pagar por suas palavras.

No decorrer dos anos, o conceito de imunidade foi, contudo, mudando. Na verdade, adaptando-se (ou melhor, desfigurando-se) aos vícios de uma política tantas vezes corrupta e impune. De imunidade, passou à impunidade. Parecendo ter descoberto o Eldorado do crime, parte considerável (mas não considerada) de nossos parlamentares vislumbrou cinicamente a imunidade como uma espécie de blindagem para roubo de dinheiro público, homicídios e outros malfeitos.

Ávidos por matar e roubar, fizeram mágica, transformando uma das nobres garantias instituída em uma sociedade democrática em algo podre. Brutamontes sem eloquência e sem discurso, ignoraram a imunidade como uma prerrogativa do exercício do cargo (porcos desconhecem o valor das pérolas). Passaram então a usá-la como privilégio que os blindaria em suas atividades mais que ilícitas.


Eis a sabedoria popular: quem não deve não teme. Por que a 17ª Vara amedronta tanto? Elogiada no Brasil por seu trabalho de moralização, ela é a esperança de que um dia a nobre imunidade seja de fato o que ela é – uma prerrogativa de idôneos homens públicos cuja voz é a voz do povo. Afinal, o parlamentar é eleito para “parlar” (falar). Ele não disputa uma eleição para, eleito, matar e roubar.

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