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quarta-feira, 3 de setembro de 2014

UM TEXTO DE RONALD MENDONÇA

MEGALOMANIA TEM CURA


A partir dos 12 anos eu e meus irmãos passaríamos a viver num hospital psiquiátrico. Não há muitas experiências semelhantes no mundo inteiro. Quero acreditar que a convivência diuturna com portadores de distúrbios mentais não tenha nos tornado mais ou menos "loucos" em relação à média das pessoas ditas "normais". Embora isso cause inexplicável "frisson" em algumas pessoas, essa convivência nos dotou de um feeling, um "faro" especial para identificar malucos a quilômetros de distância. Quase um Dr. Bacamarte do conto de Machado de Assis
Logo no primeiro ano de medicina o nosso contato se revestiria de algo "profissional". Treinados por nosso pai, escrevíamos as histórias.
(Ainda não me tornara um "dissidente" e me bandearia para a neurocirurgia). Digo "profissional", porque antes disso nossa atuação no hospital restringia-se a auxiliar administrativo e "agitador esportivo" promovendo torneios centrados no futebol de salão. Nas anamneses é que descobríamos verdadeiramente o móvel que tinha levado aquele cidadão ou cidadã a procurar auxílio num hospital psiquiátrico. Foi uma experiência fantástica. Recordo das lições do meu pai ao descrever a "irrefutabilidade" dos delírios e alucinações. De fato, não havia convencimento. Não adiantava argumentar. O doente estava certo de que o seu vizinho, junto com a sua mulher, estava se preparando para matá-lo. Pessoas roubavam seus pensamentos onde quer que chegassem.Os americanos (ou russos) iriam invadir o país a qualquer momento. Muitos tinham os pensamentos lidos por estranhos. A contra-argumentação era recebida por um risinho de mofa... Dias depois, os aprendizes de psiquiatra eram surpreendidos com uma constatação. Após iniciarem o tratamento com neurolépticos ou eletrochoque, aquelas "irrefutáveis" certezas haviam se desmanchado como os sólidos de Marx. O que antes era uma verdade absoluta, transformava-se numa mera desconfiança, quando muito. A esposa era recebida com alegria. Até o vizinho era alvo de boas vindas e atenção. Não me lembro se havia pedidos de desculpas pelos mal-entendidos. Quem sabe?
Enveredei pela neurocirurgia mas não abandonei o cacoete de observar as pessoas com o olhar psiquiátrico. É horrível. Pior é quando levo isso para os comentários políticos. Até há dois meses, o governo federal (dona Dilma) tinha uma certeza irrefutável de vitória no primeiro turno. Apesar de vaiada onde que que estivesse (detestada mesmo pela população), a presidenta-gerenta brandia índices escandinavos de aprovação e intenções de voto. Era uma coisa inacreditável. Eu conversava com as pessoas, gente do povo, meus clientes (tenho a felicidade de não ter clientes ricos) e o nome da presidenta-gerenta não tinha essa bola toda. Só os meus amigos socialistas é que se mantinham irrefutáveis nas suas certezas de vitórias.
 O Aécio Neves, coitado, era ridicularizado nos seus 20% de intenções. Meus socialistas prediletos queriam unanimidade. Não aceitavam qualquer tipo de oposição. O que disseram do Aécio é impublicável. De cheirador a "pedê", passando naturalmente por agente do capital estrangeiro, filhote da mídia golpista e rancorosa e ladrão de aeroporto. Apareceu o Eduardo Campos. Um lulista disfarçado de oposição. Mesmo assim, Lula o batizou de Judas, ingrato e outras adjetivações. (Vc acreditou naquelas lágrimas no enterro do Campos?).
Agora surgiu a Marina e estourou a boca do balão. Está ameaçando tirar madame do trono. Os delírios de poder absoluto estão minguando. As baterias estão apontadas para a ex-seringueira. E aí, Marina tem consistência? Não. Seu governo prenuncia-se como desastroso. O que a Marina tem que agrada tanto? Seria seu ar de sofrimento? De carmelita descalça? Uma coisa parece certa: Marina é muito melhor pessoa que Dilma. Mas ao cabo e ao fim, a incerteza e o desânimo estão fazendo companhia aos petistas et alii. Tomaram neurolépticos e estão se curando da megalomania.


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