UM TEXTO FORA DE ÉPOCA: VIVA O PINTO DA MADRUGADA
Alberto Rostand Lanverly
Membro das Academias Maceioense e Alagoana de Letras e do IHGAL
Recordo quando, em minha infância, nas semanas que antecediam o tríduo momesco, residindo nas proximidades da Praça Gonçalves Ledo, no Farol, descia a Ladeira do Brito até a Rua do Comércio para, sentado sobre uma das muitas marquises das lojas ali existentes, apreciar a graciosidade e alegria, tanto dos blocos carnavalescos quanto do desfile de carros, – a maioria jipes – no popular corso. Ao término da movimentação, retornava para casa fazendo o caminho inverso, sempre evitando a Ladeira dos Martírios, onde, diziam, por volta da meia noite as almas dos corpos enterrados nas paredes da centenária igreja, que lhe deu o nome, saiam para correr atrás de quem por ali trafegava.
Os tempos decorreram mas, para minha surpresa, o temor que outrora me dominava, ainda hoje maltrata meu coração. Não mais envolvendo os mortos, porém os vivos e, o que é pior, não somente os maltrapilhos que, sob motocicletas ou a pé, roubam, assaltam e matam, por míseras moedas ou reais, mas, principalmente, os que, pilotando suas importadas máquinas poderosas, vestindo as grifes da hora, e marcando os minutos do dia em rolex de ouro, saem por aí exterminando toda uma geração, com atos egoístas sempre prolatados em beneficio próprio.
Compreendo, contudo: neste mundo de violência o povo brasileiro de todos os níveis sociais demonstra, em determinadas épocas do ano, possuir a capacidade de conviver com seus semelhantes, sem maiores assombros e até com certa tranquilidade, apesar do tumulto gerado pela aglomeração. Elejo, como exemplos, as festas natalinas e os jogos da seleção brasileira, em época de copa do mundo. Parece, por determinados momentos, que o espírito da cordialidade exorciza o mal. Nos dias atuais, em Maceió, incluiria neste rol o desfile anual do “Pinto da Madrugada”.
Mais de duzentas mil pessoas, com o objetivo único de se divertirem, evoluem na avenida quase sempre bebendo e muito... Tudo isto em clima de paz e harmonia, deixando ver a verdadeira face do povo maceioense e alagoano: alegre, decente e honesto.
Em minha concepção, o desfile do Pinto da Madrugada é uma peça de teatro que não exige ensaios, em cuja ribalta as pessoas cantam, riem e mais que nunca vivem intensa e pacificamente até quando as cortinas se fecham, com o último acorde dos instrumentos da orquestra que anima a festa. Por este motivo transformou-se em um sucesso.
A cada ano, venho verificando: quando me integro ao “Pinto da Madrugada” meus medos dos vivos diminuem, ao tempo em que só penso no que sinto: nada mais que pura alegria...
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