terça-feira, 5 de maio de 2015

UM TEXTO DE ALBERTO ROSTAND

A CULTURA QUE QUERO E MEREÇO...
Alberto Rostand Lanverly
Membro das Academias Maceioense e Alagoana de Letras e do IHGAL
            Outro dia, durante uma das muitas viagens realizadas ao interior de Alagoas, cheguei a um povoado, na periferia da cidade de Pariconha. Era a hora do almoço. Estacionado o veículo embaixo da única sombra existente na Praça central, dirigi-me a um ambiente que poderia definir como um mix alimentício, onde funcionavam restaurante “Selv Servi” (Sic!!!), padaria, açougue, sorveteria e até mercearia. Optei pelo prato do dia: ossobuco acompanhado de fava e rapadura.
            Enquanto o pedido era preparado, permaneci olhando as redondezas até fixar-me em uma jovem senhora, sentada no batente do ponto comercial onde me encontrava, parecendo separar alimentos dispostos sobre uma toalha,  mantendo um telefone celular preso entre o ombro e o ouvido. Falava como se estivesse resolvendo os problemas do mundo todinho. Mais adiante, vislumbrei um grupo de pessoas descalças, varrendo a rua. Do outro lado, enxerguei o prédio da Prefeitura e, na porta, inúmeros eleitores à espera do líder maior da cidade.
             Minutos depois, já almoçando – comida excelente por sinal  – imaginei que no Brasil, mesmo quando a propaganda oficial informa o contrário,  o povo está divorciado de cultura, encolhendo-se, não somente em sua fome, como, acima de tudo, em uma ignorância patrocinada pelas autoridades que assim os querem, para satisfazer seus anseios egoístas. De que adiantaria, naquele momento, oferecer um livro a qualquer daqueles circunstantes se nem ao menos saberiam tê-lo?
            Meu pensamento flutuou para este prisma, porque, dias antes fora procurado por um garoto, com pouco mais de 12 anos de idade, residente em Maceió, buscando entrevistar-me para cumprir atividade acadêmica. Quando frente a frente, ele me questionou: qual a diferença entre cultura popular e erudita...? Respondi que a primeira tinha no carnaval um exemplo claro, enquanto a ópera, concertos e peças teatrais bem representariam a segunda. Pedi a meu jovem interlocutor que incluísse em seu trabalho, também, a cultura de massa, sendo a corrupção desenfreada o retrato do país onde vivemos.
            A mulher continuava cuidando dos alimentos. Distingui, claramente, juntando-a feijão em um montão único e, depois, separando as sementes uma a uma para retirar os estragados. O primeiro gesto era  o mais simples. Imaginei se,  ao invés de um pano estendido no chão tivéssemos uma cidade qualquer, e, ao invés de feijões nos deparássemos com pessoas, juntando-as todas em um campo de futebol, por exemplo. Seria menos complicado distinguir cada uma por suas virtudes. O gesto da segregação ou personalização dos seres pertencentes a uma civilização é  seu processo de cultura.
            Cada dia fica mais explicito: não há cultura que resista sem civilização, nem civilização que perdure sem cultura. Resta ao brasileiro escolher qual das culturas gostaria de abraçar: a erudita, a popular ou a de massa.
            PS: O Jovem, a quem concedi entrevista, chama-se João Victor, neto de Branca Rosa Fragoso e bisneto de Corália e Paulo Silveira, este último, um dos homens mais cultos que viveu na Terra dos Marechais, e que, este ano se vivo fosse, completaria centenário de vida. Muito me orgulha  ter a honra de hoje ocupar, na Academia Alagoana de Letras, a cadeira que um dia lhe pertenceu.

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